Oportunidades nas Mudanças de Hábito

Oi, pessoal! “Bons artistas copiam, grandes artistas roubam” é uma frase atribuída a Pablo Picasso e repetida por Steve Jobs. Uma adaptação para o mundo dos negócios seria: “Bons empreendedores surfam uma onda; grandes empreendedores criam uma.”

Hoje, vou falar sobre oportunidades que se encaixam nesse segundo grupo: empresas que conseguiram criar novos hábitos e transformaram o comportamento dos consumidores. No final, vou listar algumas ideias inspiradas nessa abordagem.

Se tiver apenas um minuto, segue um resumo:

1. Tudo ao seu redor, que você chama de vida, foi criado por pessoas que não eram mais inteligentes do que você. Quando entendemos isso, as possibilidades se abrem. Você descobre que pode mudar o mundo, influenciá-lo e construir coisas para outras pessoas usarem

2. Escovar os dentes, tomar café da manhã, suco de laranjas, anés de diamante para noivado, lista de presentes para casamento e chá de bebê. Todos esses hábitos foram criados por empresas

3. Com o surgimento de novas tecnologias, como IA, novos hábitos serão criados e produtos para atendê-los, ou vice-versa

As Três Oportunidades para Empreender

Garry Tan, CEO da Y Combinator, defende uma tese de que as startups de maior sucesso são impulsionadas por um de três fatores:

• Novas Tecnologias que possibilitam soluções inovadoras

• Mudanças Regulatórias que abrem novas oportunidades

• Mudanças no Comportamento Humano que criam novas demandas

Esses fatores respondem a uma pergunta fundamental na criação de novas empresas: “Por que agora?”. É essencial haver um motivo que justifique o sucesso de uma empresa recém-criada.

Na internet, há bastante conteúdo sobre como Novas Tecnologias abriram caminho para a criação de empresas de sucesso, então não cobrirei isso aqui. Também não abordarei as oportunidades surgidas das Mudanças Regulatórias. Em um país como o Brasil, altamente regulado, esse tema é relevante. Em especial no campo das Fintechs, o Banco Central tem se mostrado inovador, permitindo o surgimento de startups como Nubank, XP, PagSeguro e Stone, entre outras, por meio de avanços regulatórios.

Quero focar no terceiro fator. Falamos pouco sobre empresas que nascem a partir de novos comportamentos e, além disso, pergunto: seria possível criar um novo comportamento e transformar a maneira como as pessoas vivem?

Tudo foi Criado por Alguém

“Tudo ao seu redor, que você chama de vida, foi criado por pessoas que não eram mais inteligentes do que você. Quando entendemos isso, as possibilidades se abrem. Você descobre que pode mudar o mundo, influenciá-lo e construir coisas para outras pessoas usarem.”.

A frase acima é um dos principais ensinamentos de Steve Jobs, fundador da Apple. É uma sabedoria com a qual muitos concordam, mas nem todos absorvem profundamente o seu significado. Tudo em nossas vidas foi criado por alguém — e isso inclui nossos hábitos.

Até mesmo as coisas mais óbvias da nossa rotina, aquelas que nos fazem pensar “Como as pessoas viviam antes disso?”, foram criadas por alguém. Na verdade, muitas dessas inovações foram desenvolvidas e disseminadas por empresas com o objetivo de vender produtos ou serviços. Vamos conhecer alguns exemplos:

1) Escovar os Dentes

Na década de 1900, apenas 5% dos americanos escovavam os dentes regularmente — o mercado era pequeno. Foi então que o publicitário Claude Hopkins, ao tentar conquistar a conta da fabricante de pastas Pepsodent, apresentou um conceito inovador.

Sua ideia não era vender o hábito de escovar os dentes como uma prática saudável (embora fosse), mas sim como algo aspiracional. Aproveitando a recente obsessão do público pelas estrelas de Hollywood, ele introduziu o slogan “Movie Star Smile” (Sorriso de Estrela de Cinema). Hopkins focou em transformar o sorriso branco e saudável em um símbolo de status, algo que todos poderiam desejar.

A pasta Pepsodent deixava uma sensação refrescante ao final da escovação, e a propaganda associava essa sensação a dentes limpos. Ele implantou a ideia de que, ao não escovar os dentes, as pessoas estariam perdendo algo valioso — um sorriso digno das telas de cinema.

Em uma década, a penetração do hábito de escovar os dentes saltou de 5% para 60%, e a Pepsodent dominou o mercado. Nas décadas seguintes, esse hábito continuou a se expandir até atingir toda a população. O marketing de Hopkins não apenas vendeu um produto, mas também criou uma rotina essencial na cultura global.

2) Tomar Café da Manhã

Ainda no tema do início do dia, todos já ouvimos que “o café da manhã é a refeição mais importante do dia”. O que poucos sabem é que essa frase é mais um sucesso de marketing do que um consenso científico. Embora vários estudos apontem benefícios potenciais, como maior energia e controle do apetite ao longo do dia, as evidências científicas sobre a importância específica do café da manhã são variadas. Na verdade, a necessidade dessa refeição depende muito do estilo de vida, idade e metabolismo de cada pessoa. Em alguns casos, o jejum intermitente (que frequentemente implica em pular o café da manhã) pode ser mais benéfico.

Foi a empresa Kellogg’s que popularizou e padronizou o café da manhã na rotina dos países ocidentais. Antes disso, o desjejum era mais variado, e muitos o pulavam ou consumiam uma refeição rápida e pesada, como carne e ovos. A Kellogg’s lançou uma campanha que mudaria a relação das pessoas com o café da manhã para sempre.

A empresa introduziu os flocos de milho e fez uma campanha de marketing com foco em uma alimentação leve, saudável e de fácil digestão, “ideal para começar o dia”. O desafio era convencer os consumidores. Como parte central da campanha publicitária dos flocos, vinha o apelo: “O café da manhã é a refeição mais importante do dia”, associando uma refeição nutritiva à saúde e ao bem-estar.

Esse slogan não apenas popularizou os cereais, mas também deu início a uma mudança de hábito. Ao longo das décadas, milhões de famílias passaram a considerar o café da manhã essencial, influenciadas pela ideia de que ele traz energia e produtividade.

Mesmo produtos mais naturais, como o suco de laranja, ganharam popularidade por meio de estratégias de marketing. No caso, a California Fruit Growers Exchange criou o slogan “Drink an Orange” (Beba uma laranja) para lidar com o excesso de produção de laranja, incentivando o hábito de consumir suco pela manhã.

3) Comprar Anel de Noivado de Diamante

O trabalho de um vendedor de anéis de noivado com diamantes é relativamente fácil. O consumidor, na maioria das vezes, é uma pessoa sem muita informação sobre o preço do produto que está comprando e, geralmente, está apaixonado. O anel se torna uma representação desse amor. Mas sinto em dizer aos leitores que estão prestes a pedir o amor de suas vidas em casamento: esse hábito também foi criado por uma empresa.

Na década de 1930, a De Beers controlava 90% da produção mundial de diamantes e enfrentava uma crise de demanda devido à Grande Depressão. Passada a Segunda Guerra, a empresa lançou uma campanha que transformou o diamante em item essencial para casais. Com o icônico slogan “A Diamond is Forever” — uma frase que simbolizava a durabilidade do amor e que passou a estampar anúncios e até filmes —, a De Beers redefiniu o mercado. Em poucos anos, as vendas de diamantes de noivado dobraram. Ainda pior foi a “regra” de precificação criada para o anel: ele deveria custar o equivalente a dois meses de salário do comprador.

O impacto foi avassalador. Em 1939, apenas 10% dos anéis de noivado nos Estados Unidos incluíam diamantes. No final da década de 1950, mais de 80% dos anéis de noivado já possuíam um diamante como peça central. Essa campanha transformou os diamantes em um mercado bilionário.

4) Listas de Casamento e Chá de Bebê

Existe um conceito que aprendi quando morei nos EUA: “Organized Fun” (Diversão Organizada). O nome é autoexplicativo e a lógica é simples. Da mesma forma que uma empresa organizada tende a ter mais sucesso do que uma bagunçada, se organizarmos nossos eventos sociais com algumas regras, eles também podem ser melhores. É por isso que, nos EUA, jantares têm hora para começar, para terminar, e todos seguem o planejamento à risca.

A analogia capitalista é que podemos transformar a diversão desorganizada em consumo organizado.

Esse conceito funcionou muito bem em momentos de transição de vida. Quando passamos por mudanças, é reconfortante saber que temos uma rede de apoio. E como mostramos esse apoio? Comprando presentes e gastando dinheiro!

Na década de 1920, a loja de departamentos Macy’s percebeu uma oportunidade de transformar o casamento — um dos momentos mais importantes na vida de seus clientes — em uma ocasião de consumo organizado. Ela criou o conceito da Lista de Presentes de Casamento, onde os noivos podiam listar os itens que desejavam ganhar para equipar sua nova casa. A lista incluía móveis, utensílios domésticos e itens de decoração, todos disponíveis na loja. Hoje, as listas de presentes são um padrão cultural no mundo todo.

Nos anos 1950, a Johnson & Johnson lançou campanhas que promoviam o “Chá de Bebê” como um momento de preparação e apoio aos pais. Esses anúncios incluíam panfletos e guias que sugeriam listas de produtos como fraldas, loções e sabonetes — todos itens essenciais para recém-nascidos, oferecidos pela própria marca. Hoje, o chá de bebê é uma tradição nos Estados Unidos e vem ganhando popularidade no Brasil.

A Macy’s e a Johnson & Johnson são dois exemplos de empresas que transformaram momentos de transição em eventos de consumo organizado, agora enraizados na cultura popular.

Aprendizados

Aqui no bsb, os leitores não buscam apenas histórias interessantes — eles procuram um ângulo empreendedor, sempre ligado à tecnologia. Os exemplos acima nos ensinam algumas lições:

• Os consumidores são carentes: Vivendo uma vida rotineira, há uma demanda, ainda longe de seu teto, por coisas que os tirem da monotonia.

• O Departamento de Marketing tem muito valor: Para a audiência do bsb, composta em grande parte por engenheiros, administradores e desenvolvedores, é essencial lembrar o valor desse setor.

• Playbook de Criação de Empresas: Grandes produtos podem ser criados por meio de campanhas de marketing que introduzem novos hábitos, combinadas com novos serviços possibilitados por tecnologias de ponta.

Depois de refletir sobre tecnologias e mudanças de comportamento, tive as seguintes ideias de produtos. Se alguém tiver interesse em desenvolvê-las, fiquem à vontade:

Diário IA

À medida que o papel se tornou acessível para novas camadas da população, um dos hábitos que rapidamente se difundiu foi o de manter um diário. Nele, as pessoas registravam atividades, sentimentos, emoções e impressões. Algumas figuras históricas são melhor compreendidas hoje porque seus diários foram preservados. Esse hábito, no entanto, saiu de moda com a chegada do computador.

Acredito que, por meio da Inteligência Artificial, podemos resgatar o hábito do diário. Em vez de papel e caneta, enviamos áudios para modelos de IA personalizados, que catalogam nossos pensamentos. Esse material pode ser analisado por uma “IA psicóloga”, que nos ajuda a processar os desafios do dia e, no final do dia, faz uma “mini-sessão”. Outra abordagem é tratar o diário como um psicólogo virtual: você envia o áudio de suas emoções, e ele responde como um terapeuta. Poderíamos até criar “terapeutas” de IA baseados em personas, como Jung ou Freud.

Cockpit 18

Um evento de transição que ainda não foi transformado em consumo organizado é o momento em que nos tornamos adultos perante a lei. Ao completar 18 anos, muita coisa muda do ponto de vista jurídico, mas não somos bem orientados sobre essas mudanças.

A ideia aqui é criar uma IA que funcione como um cockpit para o início da vida adulta. Ela explicaria tudo o que é necessário começar a fazer, como tiro de guerra, declaração de imposto de renda, abertura de contas, emissão de carteira de trabalho, etc. Essa solução poderia ser uma ótima maneira de atrair jovens consumidores para um super app.

Planejamento Tributário 2.0

As alíquotas de imposto de renda estão subindo no mundo inteiro, e isso não é exclusividade do Brasil. A diferença, desta vez, é que temos tanto uma discussão ampla sobre o tema quanto ferramentas acessíveis de planejamento tributário.

No passado, devido aos altos custos, apenas famílias abastadas podiam contratar contadores e advogados tributaristas. Formar veículos legais, como fundos fechados, holdings ou empresas de administração imobiliária, também implicava custos proibitivos. Com a IA, em breve teremos esses serviços automatizados, a uma fração do custo dos prestadores atuais. Acredito que o planejamento tributário se tornará parte do dia a dia de pessoas e empresas de todos os portes. Com a automação, essas soluções também se tornarão acessíveis e baratas.

E você, o que acha? Que novos hábitos veremos em breve na nossa sociedade?

Grande abraço,

Edu

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