O bsb é uma newsletter semanal sobre a arte e ciência de construir e investir em empresas de tecnologia. Para receber nossos e-mails, basta clicar abaixo:

Oi pessoal, tudo bem? Estamos retomamos a sequência de artigos educacionais sobre blockchains. Tem muito conteúdo bacana vindo nas próximas semanas.


🤗 Twitter: entender a token economia de um projeto crypto é tarefa fundamental para qualquer investidor e empreendedor no setor. Entender que valor se dá pelo fluxo de caixa e pela utilidade é uma mudança de paradigma importante.

👍🏻 Nutella:

  • Entender a token economia de um protocolo blockchain é fundamental para qualquer análise séria
  • É preciso entender o lado da oferta de tokens, não apenas a atual, mas futura, cronograma de desbloqueio de tokens
  • Hoje a principal metodologia de valuation de tokens é uma mescla das análoses de empresas – fluxo de caixa descontado e múltiplos – com o cálculo de valor utilitário do token
  • Atualmente a maioria das blockchains são inflacionárias e precisam de nova demanda continua de investidores para manter seus preços. Em crypto, o ativo e o serviço/negócio que este oferece são coisas diferentes e algumas vezes pouco correlacionado

👊🏻 Raiz: 

Quando um investidor americano analisa uma empresa num país emergente, um dos componentes essenciais a serem entendidos é política monetária. Países com alta inflação tem maior risco de perda de valor ao investidor.

A segunda “política monetária” é a da própria empresa em questão. Se esta precisa emitir novas ações para financiar seus projetos, isso é uma forma de inflação. Investidores de startups sempre consideram diluições subsequentes ao calcularem seus retornos. Este tema vai ganhando complexidade a medida que consideramos que diferentes tipos de ações podem ser emitidas (ex: ordinária ou preferencial), com cronogramas particulares. No exemplo oposto temos empresas que recompram de ações, criando deflação com objetivo de valorizar o valor unitário da ação.

Token economia, ou “Tokenomics” descreve a matemática e incentivos que governam os crypto ativos. Inclui tudo sobre a mecânica de como este funciona, assim como as forças psicológicas e comportamentais que afetam seu valor no longo prazo. Token economia tem um bom paralelo com o exemplo de investir em mercados emergentes.

Projetos com token economia bem desenhada tem uma probabilidade muito maior de serem bem sucedidos no longo prazo, pois fizeram um bom trabalho de incentivar a compra dos tokens por investidores de longo prazo. Projetos com token economias mal feitas estão fadados ao fracasso, pois as pessoas vão vender rapidamente os tokens ao primeiro sinal de problema. Se você está considerando investir num crypto ativo, entender a token economia é fundamental.

Tokens

Um token é um objeto que representa outra coisa, como outro objeto. Isso é um conceito abstrato. Vamos dar um exemplo simples, quando ganhamos um presente de aniversário, podemos chama-lo de token, pois o presente representa o sentimento de carinho que a pessoa tem por nós. Meio viagem? Ok. Outro exemplo mais tangível é uma ação, ela representa o direito sobre os ativos e o fluxo de caixa de uma empresa. O seu título de eleitor é um token, pois representa o seu direito dentro da democracia de um país. Em resumo, tokens podem ser muitas coisas e sempre vale a pena perguntar para ter certeza do que significam em cada situação.

Economia se resume a Oferta e Demanda

Na primeira aula de qualquer curso de economia é explicado que as duas forças mais poderosas são de Oferta e Demanda. Entender como estas duas forças vão evoluir nos dá uma boa noção da direção do preço de um token.

Oferta: Emissão, Inflação, distribuição e prazo

O lado da oferta é um pouco mais fácil de entender. De forma simples, o valor de um token aumenta quanto menos tokens existem, a chamada deflação. No inverso, o valor diminui se existem mais tokens, isso é inflação. Neste primeiro momento não estamos pensando no valor econômico que será criado, não importa (agora) se o token vai gerar uma renda. As principais perguntas que fazemos são:

– Quantos tokens existem hoje?

– Quantos vão existir?

– Qual o cronograma de emissão de novos tokens?

O exemplo mais simples é o do Bitcoin. A oferta de BTC é (i) pré-determinada, (ii) imutável, (iii) conhecida, (iv) tem valor máximo. Respondendo as perguntas acima:

– Quantos tokens existem hoje? Cerca de 19 milhões.

– Quantos vão existir? 21 milhões.

– Qual o cronograma de emissão de novos tokens? A emissão de novos tokens acontece a uma taxa que diminui pela metade mais ou menos a cada 4 anos. Desta forma sabemos que 90% da oferta já esta em circulação e apenas 10.5%, ou 2 milhões de BTCs restantes serão lançados nos próximos 120 anos, de forma que não deveríamos esperar nenhum tipo de pressão inflacionária diminuindo o valor do token.

Cronograma de Emissão de Bitcoin

No caso de Ethereum a oferta é de 118 milhões de tokens, sem qualquer tipo de limite no. No entanto o Ethereum recentemente mudou sua política de emissão de tokens, de forma a chegar num estoque estável ou até mesmo deflacionário através de um ajuste de queima de tokens, parecido com uma recompra continua de ações.

A última coisa que devemos considerar é a alocação dos tokens. Se poucos investidores possuem a maioria dos tokens, estão bloqueados de vender, mas este bloqueio vai acabar em breve, isso vai gerar pressão de venda. É muito importante ter estes dados sobre um token que você esta planejando investir, trabalhar, interagir com antes de iniciar qualquer novo projeto.

Pensando aqui, é um pouco sacanagem minha utilizar apenas o exemplo do Bitcoin pois ele é simples. Na pratica os diferentes projetos possuem múltiplas nuances e métricas que precisamos acompanhar:

Valor de mercado (Market Cap): número de tokens disponíveis X preço atual

Valor de mercado totalmente diluído (Fully diluted valuation): número máximo de tokens que entrarão em circulação X preço atual.

Idealmente o Market cap e o Fully diluted valuation são o mais próximo possível, ou variam até no máximo 3-4x. O problema quando a diferença entre estas duas métricas é muito grande, digamos de >10x pois é provável que em breve uma grande quantidade de tokens venham a mercado, ou seja, estes não estavam disponíveis para venda e agora estão – semelhante ao que acontece quando uma ação esta num acordo de acionista e este vence ou uma opção de ação atinge a maturidade. Isso muda a curva de oferta, levando a choques de preço.

Se por um lado entender a oferta de tokens em absoluto é algo em que temos uma boa transparência, o desafio realmente são os cronogramas de destravamento de tokens.

A principal pegadinha aqui é que, enquanto em ações listadas a liquidez é bem mapeada, no caso de protocolos crypto não existe nenhuma base de informações. Você pode investir num protocolo com 10 milhões de tokens líquidos sem saber que no dia seguinte 100 milhões de tokens serão liberados para venda.

Uma boa pratica de governança de um protocolo inclui prover transparência sobre a divisão dos tokens por stakeholders e qual o cronograma de destravamento. Em geral são detentores de tokens os seguintes grupos:

1) Equipe fundadora

2) Investidores

3) Usuários e Comunidades

4) Conselheiros e parceiros estratégicos

5) Tesouraria da Entidade que criou o protocolo

Um exemplo simples é o do Uniswap, veja como a divisão dos tokens é bem diferente daquela de uma empresa de tecnologia:

Distribuição de tokens do Uniswap quando fez sua rodada Series A

O cronograma é importante pois investidores compram tokens e se comprometem a não vende-los por um certo período de tempo, digamos de 2 a 4 anos. Depois que este tempo passa, os tokens em geral não são liberados para venda de imediato, mas sim seguindo uma regra. Talvez 25% sejam liberados no primeiro ano de liberação e o restante pro-rata mês a mês até o final do ano quatro. Eu por exemplo estou investido num protocolo com este cronograma.

Existem uma série de metodologias para entender que tipos de cronograma são melhores ou piores, mas de forma geral, quanto mais uniforme e transparente, melhor.

Demanda: mais interessante e também mais difícil

Entender a demanda é muito mais difícil e é o tema chave das análises. Demanda deriva da expectativa dos investidores com a receita ou fluxo de caixa que o protocolo para seus detentores gera a partir dos serviços que desempenha. Por exemplo, no caso do Ethereum, um investidor pode comprar tokens na expectativa de utiliza-los em diferentes serviços ou pode “stake it”, ou seja, utiliza-los para ajudar a manter a rede segura como um validador. Como ninguém trabalha de graça, esse investidor será remunerado ao fazer esse serviço, a uma taxa de 5% ao ano. Outros protocolos pegam seus lucros e fazem recompra de tokens, semelhante a recompra de ações, outros pagam o equivalente a dividendos. No entanto é MUITO importante entender que estes sempre são pagos em tokens e não em dólar ou real brasileiro.

Existem investidores que compram um token que sabem que não tem qualquer fluxo de caixa. Eles compram, pois, esperam que alguém vai pagar mais depois. Isso se chama especulação e não vou gastar muito tempo falando disso pois acho uma bobagem.

Analisando como um investidor

Value investors da Faria Lima e Leblon podem explicar melhor que eu a diferença entre valor econômico e preço. Preço é a taxa de troca de um ativo por outro (ex: Ação da Petrobras por Dólar ou Real). O valor é calculado a partir do entendimento da sua oferta e da sua demanda. A demanda é mais incerta e foco da análise.

O que pode gerar demanda?

  1. Fluxo de caixa proveniente das receitas menos despesas do token
  2. Direitos de Governança: vide o fato de ações ordinárias e preferenciais terem preços diferentes
  3. Pagamento de serviços: no caso do Ethereum, você precisa de Ether para pagar pelos serviços que consome na blockchain.

Aqui os investidores começam a discordar. Enquanto alguns se focam apenas nos itens 1) e 2), outros levam mais em consideração o 3).

Enquanto o valor de um ativo é determinado pela soma do fluxo de caixa futuro descontado, o valor de uma utilidade (ex: pagamento de serviços) é determinado pelo valor econômico dos serviços e bens que podem ser comprados via pagamento. Desta forma, o valuation de um token é mais complexo que o de uma empresa.

Isso não é algo inédito, existem exemplos semelhantes. Para ir numa reunião da Berkshire Hathaway, holding de investimentos liderada pelo lendário Warren Buffet, é preciso ser acionista da companhia. Existe um padrão de investidores que se tornam acionistas apenas para poder ir na reunião e depois vendem suas ações. O valor da ação da Berkshire pra eles é o ingresso para o evento e estão dispostos a pagar o custo de oportunidade de deixar o dinheiro em ações da Berkshire para fazer isso.

Enquanto o valuation de um protocolo da perspectiva de investimento é relativamente simples e equivalente ao de uma empresa, o valuation pela perspectiva da utilidade do token é menos comum:

O valor utilitário do token é calculado pela Atividade econômica do Token dividida pelo produto da oferta de tokens circulantes multiplicado pela velocidade do token.

  • Atividade econômica é o valor dos serviços comprados utilizando o token. Isso pode incluir transações de serviços, aplicativos descentralizados e etc.
  • Oferta de tokens circulantes é o número de tokens disponíveis para compras de serviços.
  • Velocidade é o número de vezes que um token é gasto na média, por período. Para referencia, a velocidade do Bitcoin é de 1.1 a 1.6 por trimestre.

Ao triangularmos a metodologia de fluxo de caixa e de utilidade junto a de múltiplos e comparáveis, começamos a desenhar um modelo para precificarmos crypto ativos, algo essencial para se investir e trabalhar com uma nova tecnologia.

A pegadinha crypto

Existe um elemento muito importante que poucos investidores se atentam e advoga contra a tecnologia blockchain. A verdade é que a maioria das blockchains são inflacionárias e não conseguem justificar seus valuations via fluxo de caixa.

Uma DRE de uma blockchain é bem simples. No lado das receitas temos taxas cobradas pelos serviços. No lado dos custos, temos tokens que são dados a todos os validadores que garantem a segurança da rede. Validadores estes na casa dos milhares para protocolos como Ethereum. Estes validadores são pagos via emissão de tokens, dessa forma gerando pressão inflacionaria.

Veja o caso de Bitcoin, apesar de termos apenas 10.5% a ser emitido, a verdade é que diariamente $31 milhões de dólares são emitidos todos os dias e precisam ser absorvidos pelo mercado.

Exemplo de inflação anual de protocolos e emissão diária

Vamos comparar com ações listadas: todos os dias milhares de investidores compram ações de forma automática e programática. Existe uma pressão de compra. No caso de crypto, é o inverso, existe uma pressão de venda. A forma como essa equação fecha tem sido em vários casos através de demanda do investidor de varejo, que compra tokens na expectativa que aumentem de valor. Uma conta do site Crypto Pragmatist coloca em $8.5 bilhões a necessidade de novo capital investindo em crypto para manter os preços estáveis.

Como o setor vai se tornar sustentável? Através de uma combinação de (i) crescimento exponencial; (ii) melhor monetização, via compressão de taxas aos validadores e aumento das taxas de serviço.

O framework que um investidor precisa ter é: em crypto, o ativo e o serviço/negócio que este oferece são coisas diferentes e algumas vezes pouco correlacionado. O Uniswap se tornou o principal market maker, mas não conseguiu gerar valor aos tokens…

Antes de investir é preciso se educar e estudar esse espaço. É isso que vamos fazer nas próximas semanas. Vem comigo!

Grande abraço,

Edu

DISCLAIMER: essa newsletter não é recomendação de investimentos. Seu propósito é puramente de entretenimento e não constitui aconselhamento financeiro ou solicitação para comprar ou vender qualquer ativo. Faça a sua própria pesquisa. Todas as opiniões e visões são pessoais do próprio autor e não constituem a visão institucional de nenhuma empresa da qual ele seja sócio, colaborador ou investidor.